No Ritmo da Alma

Não estou bem, minha alma e meu coração choram. Meu corpo físico já não é mais o mesmo e não reage diante de toda dor.

Este momento será só meu, nada e ninguém irão perturbar. 

Vestida com o traje adequado, me maquio e me transformo. Estou incorporada, estou linda, mas ainda não enxergo isso.

Ligo o som numa bela música, bem alto. Em um ambiente fechado só com espelhos, aos poucos meus movimentos ganham vida.

Quando danço e me entrego de corpo e alma na magia e no ritmo da música nada mais importa nesse momento. Só eu e a música.

Quanto mais me envolvo na melodia mais elasticidade e habilidade nos movimentos ganho e assim minha liberdade do corpo e da alma, liberdade que promove um autoconhecimento físico e emocional, que me liberta dos sofrimentos e pensamentos oprimidos.

E nesse envolvimento mágico redescubro meu potencial que em algum momento deixei de acreditar, ganho coragem para fazer acontecer, segurança para dizer "eu sou capaz", me sinto bela e restituo todos os laços perdidos da minha essência.

E nesse encanto me entrego ritmo após ritmo, até o fim. A música acabou, mas a minha paz interior permanecerá.

 

A dança e a alma 

A dança? Não é movimento,
súbito gesto musical
É concentração, num momento,
da humana graça natural.

No solo não, no éter pairamos,
nele amaríamos ficar.
A dança - não vento nos ramos:
seiva, força, perene estar.

Um estar entre céu e chão,
novo domínio conquistado,
onde busque nossa paixão
libertar-se por todo lado...

Onde a alma possa descrever
suas mais divinas parábolas
sem fugir a forma do ser,
por sobre o mistério das fábulas.

 [Carlos Drummond de Andrade]